“Estejam sempre prontos para dar razões de sua esperança”

Esperança é a paixão por aquilo que é possível, conforme Kierkegaard. É a estrutura originária da existência humana no mundo e a estrutura originante que qualifica a existência diante do futuro e ao mesmo tempo subverte a ordem atual. O homem vive na medida em que espera, porque o homem é esperança. 

Na Primeira Carta de São Pedro lemos: “Estejam sempre prontos para dar razões de sua esperança” (3,15).  O  versículo situa-se num contexto de admoestação diante das perseguições.  Este convite ecoa ao longo dos tempos para os discípulos de Jesus iluminarem com a esperança cristã as diferentes buscas de sentido para a existência humana. 

A esperança, enquanto virtude teologal, abre a perspectiva para Deus. Ela não só faz desembocar o presente no futuro, mas a história toda na eternidade. A esperança cristã resume em si o conteúdo da fé cristã e do sentido da história. Não é fruto de uma futurologia otimista, mas é antes o relacionamento com o Criador.  

Não é possível, portanto, confundir a esperança com a técnica de planejamento ou a perspectiva apenas de um futuro histórico.  

O sentido que a esperança cristã oferece ao ser humano não é a certeza tranquilizadora  ou a posse ilusória, mas sim o desafio e a confiança, a luta e a contemplação, vigilância e espera serena que já agora transformam o presente. Esta percepção pretende conduzir a comunidade humana para o espaço de esperança  que ocupa o coração inquieto  de cada pessoa e anunciar o futuro que germina a partir de Jesus Cristo. Ele já realizou este futuro primeiro em sua vida, morte e ressurreição, e garantiu que tem o poder de renovar todas as coisas e de criar novos céus e nova terra. 

O Filho de Deus encarnado em Jesus de Nazaré, através de sua missão, de seus sofrimentos e de sua ressurreição revelou um futuro absoluto para o cosmos e para toda a humanidade.  Sua constante pregação sobre o Reino de Deus expressou em gestos, sinais e palavras que o Pai prepara um futuro feliz para toda criação.  

O Pai e o Reino constituem o motivo do ser e do agir  de Jesus. Na obediência  fiel ao Pai e ao projeto do Reino, Jesus combate as caricaturas e miopias da sociedade do seu tempo em relação ao ser humano e a Deus. O conflito é inevitável. A nova prártica de Jesus liberta e constrói a esperança para um povo que parece rebanho perdido e sem pastor.  

Tudo o que se manifestou em Jesus se realizará na humanidade e no cosmos conforme a promessa da ressurreição do Cristo. Nas palavras do apóstolo Paulo, a criação toda aguarda, com gemidos de parto, a libertação da morte e a plena irrupção do Reino de Deus.  

Viver da esperança que Cristo prometeu significa comportar-se aqui e agora contra toda aparente perspectiva de sucesso que a história possa garantir, esperando em conformidade com aquele mundo de justiça e de paz que há de vir.  Será preciso refutar o espírito, a lógica do mal, rejeitar a idolatria do dinheiro que empobrece e combater toda destruição natural que extermina a vida no planeta. A esperança verdadeira comporta um “sim” incondicionado à vida. 


Autor: Dom Leomar Antônio Brustolin
Bispo de Santa Maria (RS) 
Fonte: CNBB