Rezando com os anjos na Santa Missa

Quando pensamos nos anjos, talvez nossas mentes divaguem para as representações comuns deles na arte: pequenos querubins desnudos voando no espaço e repousando indolentes nas nuvens. Tais representações artísticas, no entanto, não fazem justiça aos anjos, que desempenham um papel muito proeminente em nossas vidas, especialmente na vida litúrgica da Igreja. Como essas criaturas são espíritos puros, normalmente não podemos vê-las sem uma graça especial, semelhante à que foi concedida a vários santos. Porém, a liturgia apresenta alguns momentos que podem ajudar-nos a reconhecer a sua presença, e até mesmo unir-nos aos seus louvores a Deus.

Se alguém tiver dúvidas sobre a presença dos anjos, basta recorrer ao livro do Apocalipse, que descreve a liturgia celestial. Nele, São João vê os anjos adorando a Deus ao lado dos anciãos: 

E todos os Anjos estavam ao redor do trono, dos Anciãos e dos quatro Animais; prostravam-se de face em terra diante do trono e adoravam a Deus, dizendo: “Amém, louvor, glória, sabedoria, ação de graças, honra, poder e força ao nosso Deus pelos séculos dos séculos! Amém” (Ap 7, 11). 

A Igreja também enfatiza a presença dos anjos ao longo do ano litúrgico, especialmente com a festa dos Arcanjos Miguel, Gabriel e Rafael, em 29 de setembro, e a memória dos Santos Anjos da Guarda, em 2 de outubro. Missas votivas em honra dos anjos também podem ser oferecidas durante a semana, no Tempo Comum.

Como ainda não estamos no Céu, participamos da liturgia celestial por meio da liturgia aqui na terra (cf. Sacramentum Caritatis, n. 52). Como diz o padre jesuíta Jean Danielou: “A Missa é, na verdade, uma participação sacramental na liturgia do Céu, o culto oficialmente prestado à Trindade por toda a criação espiritual”. Na Santa Missa, representamos de forma física e visível os anjos e santos que louvam a Deus de forma invisível e eterna na liturgia do Céu. Um bom exemplo disso vem da liturgia católica oriental de São João Crisóstomo. Nela, o coro canta na Proskomedia: “Nós, que representamos misticamente os querubins e cantamos o hino três vezes santo à Trindade vivificante, deixemos agora de lado todas as preocupações da vida.”

No entanto, mais do que apenas representar os anjos na liturgia, somos chamados a participar com eles no culto litúrgico, unindo as nossas vozes e disposições interiores às deles, para que nos tornemos um só. Há algumas partes fundamentais da liturgia romana que tornam isso evidente. As duas partes principais da Missa que indicam isso são o Gloria e o Sanctus.

Gloria começa com as palavras cantadas pelos anjos ao anunciarem o nascimento de Jesus Cristo aos pastores: “E, de repente, apareceu uma multidão da milícia celestial com o anjo, louvando a Deus e dizendo: ‘Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por quem Ele é favorecido’” (Lc 2, 13-14). Os fiéis são convidados a participar cantando ou recitando o Glória na Missa. 

O Padre Timothy Gallagher apresentou algumas breves reflexões sobre o método do Venerável Bruno Lanteri para rezar a Missa, buscando os mesmos sentimentos dos anjos: “Contemplo a alegria com que os anjos cantam louvores ao amor salvador de Deus e ao dom de seu Filho. Peço um coração pronto para louvar a Deus com alegria por meio das palavras do Glória.” Ele também observa o seguinte: “Segundo o Venerável Bruno, quando rezamos o Glória na Missa devemos pedir os mesmos sentimentos dos anjos e um coração como o deles, ansioso por proclamar os louvores de Deus.” O Venerável Bruno sugere que não cantemos simplesmente o Glória, mas que peçamos a Deus a graça de ter os mesmos sentimentos dos anjos no momento do anúncio do nascimento de Cristo: aquela alegria e felicidade puras que os anjos sentiram ao proclamar a chegada do Messias. Na Missa, participamos da alegria dos anjos quando Cristo volta à terra no momento da consagração, quando o pão e o vinho são transformados em seu Corpo e Sangue, Alma e Divindade.

As outras partes importantes da liturgia que incluem os anjos são o Prefácio e o Sanctus. No Prefácio, o padre nos convida a nos unirmos aos louvores já entoados pelas hostes angélicas no Céu. Por exemplo, o Prefácio da festa dos Arcanjos diz:

É a vós que glorificamos
ao louvarmos os anjos e arcanjos que criastes
e que foram dignos do vosso amor.
A admiração que eles merecem
nos mostra como sois grande
e como deveis ser amado acima de todas as criaturas,
por Cristo, Senhor nosso. 
Por ele, a multidão dos anjos celebra a vossa glória
e a eles nos unimos, em exultante adoração,
cantando (dizendo) a uma só voz…

O Prefácio deixa duas coisas claras. Em primeiro lugar, honramos os anjos como honramos os outros santos no Céu. Devido à sua proximidade com Deus, prestamos-lhes a mesma veneração que dispensamos aos homens e mulheres que viveram vidas heroicas de virtude e desfrutam agora da visão beatífica. Em segundo lugar, estamos intimamente unidos a eles quando cantamos louvores a Deus e proclamamos a sua glória.

Depois do Prefácio vem o Sanctus: “Santo, Santo, Santo, Senhor Deus do universo. O céu e a terra proclamam a vossa glória…” Essa primeira parte do Santo vem do hino cantado pelos anjos no livro de Isaías e no livro do Apocalipse: “Um gritava para o outro: ‘Santo, Santo, Santo, é o Senhor Deus dos exércitos! Toda a terra está cheia da sua glória!’” (Is 6, 3). “Os quatro seres vivos, cada um com seis asas, estavam cobertos de olhos por dentro e por fora. Dia e noite, não param de exclamar: ‘Santo, santo, santo é o Senhor Deus Todo-Poderoso, que era, que é e que há de vir’” (Ap 4, 8).

Para nos ajudar a entrar com mais fervor nessa parte da Missa, o Padre Gallagher sugere o seguinte: 

Ao unirmo-nos aos anjos em louvor, o Venerável Bruno nos convida a rezar essas palavras com os mesmos sentimentos e coração [deles], com profunda gratidão pelo amor salvador de Deus, com corações elevados em ação de graças e adoração, e com a alegria daqueles que entoam o cântico celestial.

Mais uma vez, seguindo o conselho do Venerável Bruno, devemos pedir interiormente a Deus a graça de participar dos sentimentos de alegria e adoração que invadem os anjos quando adoram a Deus, para que possamos nos unir a eles ao também adorarmos a Deus na liturgia.

Embora não possamos ver os anjos durante a Missa, a certeza de sua presença deve nos ajudar a participar mais profundamente da liturgia. Quando procuramos nutrir os mesmos sentimentos que eles, ficamos mais unidos a eles e, portanto, mais próximos de Deus. Desejamos participar de seus sentimentos ao mesmo tempo que mantemos a esperança de, um dia, nos unirmos a eles para contemplar a Santíssima Trindade e cantar louvores a Deus por toda a eternidade.


Autor: Joseph Tuttle – Tradução: Equipe Christo Nihil Præponere