Desde quando a Missa precisa de “tema”?

Atualmente, em muitas paróquias e escolas católicas, tornou-se comum escolher “temas” específicos para a Missa. Uma Missa na quarta-feira de manhã na escola pode girar em torno de um tema como luz, alegria, bondade ou unidade. Os alunos e professores são frequentemente convidados a ajudar a preparar um “folheto litúrgico” com escolhas de músicas, trechos da Sagrada Escritura e, naturalmente, um “tema” claro e cativante. Podem ser criados banners, selecionadas canções e até mesmo feitas sugestões (por leigos) sobre o teor da homilia — tudo para se alinhar ao “tema” do dia.

Em alguns casos, essa abordagem temática torna-se tão predominante, que chega a substituir completamente o calendário litúrgico da Igreja. Não é raro ver as leituras prescritas para o dia serem substituídas por passagens da Sagrada Escritura cuidadosamente selecionadas para “se adequarem melhor” ao tema escolhido. Ainda mais preocupante é a tendência, em algumas paróquias ou escolas, de transferir festas importantes — como solenidades da Igreja — para um dia da semana mais “conveniente”, apenas para coincidir com um evento ou atividade.

Essa prática subverte a sabedoria com que a Igreja ordenou o calendário litúrgico, que não é arbitrário, mas foi cuidadosamente elaborado para revelar o mistério de Cristo no tempo. Como advertiu o Papa Bento XVI, “sempre que a liturgia deixa de ser vista como culto primordial a Deus… ela já não eleva espiritualmente e une, mas causa desintegração” (O Espírito da Liturgia).

Embora essa prática muitas vezes tenha origem no desejo de ajudar as crianças a se envolverem com a liturgia, ela corre o sério risco de transformar o santo sacrifício da Missa numa peça teatral. Em vez de adentrar os mistérios sagrados, podemos estar levando as crianças a ver a Missa como uma apresentação, na qual várias pessoas “entram em cena” como se fosse uma peça de teatro da escola. Os pais alinham-se nos bancos de trás, com câmeras na mão, para capturar o momento em que os seus filhos interpretam o seu papel na Missa.

Talvez essa produção emocione os alunos da segunda série, mas esse entusiasmo geralmente passa com o tempo. Os alunos do ensino médio, que já superaram a Missa como produção teatral, consideram-na algo para crianças pequenas. 

À medida que estes papéis litúrgicos são “distribuídos” e o sacerdote é posicionado como o orador do dia para reforçar uma ideia preconcebida, devemos parar e perguntar: será que esquecemos o que realmente é a Missa?

Não cabe a nós criar a liturgia. — Um amigo meu, diácono, certa vez usou uma metáfora impressionante que revela um equívoco muito comum sobre a Missa em muitas paróquias. Ele descreveu o modo como muitos católicos abordam a liturgia: tratam-na como se estivéssemos embrulhando cuidadosamente um presente para Deus, dobrando e alisando perfeitamente o papel de embrulho, amarrando o laço com perfeição e, então, entregando-o a Deus como algo que criamos para Ele. Embora bem-intencionada, essa imagem põe sutilmente o foco nos nossos próprios esforços, como se a Missa fosse essencialmente uma obra nossa, algo que oferecemos da terra ao Céu.

Mas essa não é a verdadeira natureza da Missa. Não somos nós que “fazemos” a Missa, é Deus. A Missa é, antes de tudo, uma ação dele — o sacrifício eterno de Cristo tornado presente outra vez — e nós somos os seus humildes destinatários, não os arquitetos.

Não temos liberdade para alterar o que Deus faz na Missa. Na verdade, alterações na Missa iriam contra a clara orientação do Concílio Vaticano II: “Ninguém, mesmo que seja sacerdote, ouse, por sua iniciativa, acrescentar, suprimir ou mudar seja o que for em matéria litúrgica” (Sacrosanctum Concilium, 22, § 3).

A Missa já possui um tema. — Para que possamos dar um nome adequado aos temas da Missa, a Igreja nos dá o calendário litúrgico, o ciclo das leituras e até mesmo a estrutura da música a ser cantada — particularmente os Próprios (antífonas da entrada, do ofertório; da comunhão) —, que são tirados da Sagrada Escritura.

Por exemplo, a antífona de entrada do 3.º Domingo do Advento começa com Gaudete in Domino semper (“Alegrai-vos sempre no Senhor”). Este apelo alegre de Filipenses 4, 4, dá o tom para o que a Igreja há muito chama de “Domingo Gaudete”. Mas repare no seguinte: nesse caso, o tema não surge de uma ficha de trabalho de um aluno ou da agenda de um liturgista. Vem da Sagrada Escritura, por meio da voz da própria Igreja, expressa através do canto e da oração litúrgica.

Quando criamos os nossos próprios “temas” litúrgicos, por mais nobre que seja a intenção, muitas vezes terminamos ofuscando a estrutura muito mais profunda que já nos foi dada. Pior ainda, corremos o risco de banalizar o sagrado, transformando-o em algo superficial ou sentimental.

O tema fundamental de cada Missa não é algo que precisamos inventar. Ele já nos foi dado: o mistério pascal — a morte e ressurreição de Cristo, o mistério central da nossa fé, o coração do culto cristão. Como afirma o Catecismo da Igreja Católica (n. 1085): “Na liturgia da Igreja, Cristo significa e realiza principalmente o seu mistério pascal”.

O Papa João Paulo II fez um alerta contra a tendência de transformar a liturgia em autoexpressão ou celebração comunitária. Em Ecclesia de Eucharistia, ele escreveu: “A Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambiguidades e reduções” (n. 10). A liturgia não é um “espetáculo”, mas o culto do Deus vivo [i].

De fato, o verdadeiro “tema” da Missa não é aquele que escolhemos, mas sim o sacrifício único de Jesus, presente no altar. Cada Missa é uma renovação do Calvário, sem derramamento de sangue. Quando o sacerdote sobe ao altar, ele está in persona Christi (na pessoa de Cristo), oferecendo não apenas o pão e o vinho, mas o próprio Cristo, em nome do povo. E nós, fiéis, não somos meros espectadores ou atores num palco. Estamos aos pés da Cruz, oferecendo-nos com Ele.

Recuperando a sabedoria da Igreja. — Na prática, o que isso significa? Em primeiro lugar, devemos resistir à tentação de sobrepor à Missa “temas” desnecessários, especialmente se eles tiram a atenção dos textos e dos tempos litúrgicos propriamente ditos. Devemos olhar primeiro para as leituras, orações e cânticos que a Igreja nos propõe. Eles são ricos em significado e mais do que suficientes para a reflexão orante e a pregação homilética.

Em segundo lugar, é útil que os responsáveis pelo planejamento das Missas voltem a utilizar os cantos do Próprio. Esses textos prescritos — muitas vezes esquecidos por causa dos hinos — oferecem uma visão baseada na Sagrada Escritura sobre os mistérios do dia. Esses cantos não são apenas belos, eles ajudam a preservar o caráter sagrado da liturgia e proporcionam uma orientação temática que flui organicamente da Escritura e da Tradição. São também a primeira opção a ser usada para o canto na Missa, conforme estabelecido nos documentos litúrgicos.

Em última análise, a Missa não tem a ver com a nossa criatividade, as nossas expressões ou os nossos assuntos. Tem a ver com Jesus Cristo, crucificado e ressuscitado, presente no altar. Toda a ação litúrgica deve estar a serviço desse mistério sagrado e não tirar a atenção dele.

Aproximemo-nos da liturgia não como produtores ou intérpretes, mas como adoradores. Deixemos que a Igreja, com a sua sabedoria, nos guie rumo ao sagrado, onde o verdadeiro “tema” é sempre o Cordeiro que foi imolado — e que agora reina glorioso.


Notas
Aqui, no original, o autor havia confundido a Encíclica Ecclesia de Eucharistia, que é de João Paulo II, com a Exortação Apostólica Sacramentum Caritatis, que é de Bento XVI. Atribuiu também esta última frase a Ratzinger, mas não conseguimos rastrear sua fonte verdadeira. (N.T.)

Fonte: Mark Haas – Tradução: Equipe Christo Nihil Præponere